A LINGUAGEM: O PRECEDENTE PARA SE PENSAR A LEITURA E A ESCRITA


Magno Dos Santos Vieira – VIEIRA, M. S. (UESC)

Palavras-Chave: Linguagem – Leitura – Escrita - Produção de texto – Dialogismo



INTRODUÇÃO

Nesse trabalho, apresentamos a linguagem como o ponto de partida para se compreender a relação do indivíduo com a leitura e a escrita dentro desse processo de aquisição. Trataremos um pouco dos problemas com esses elementos por questões ligadas a reproduções de métodos arcaicos. As bases teóricas darão respaldo a futuras pesquisas na área de linguagem para estudantes universitários.    
A aquisição da língua são os passos que consolidam um futuro leitor, mas as exigências quanto a sua produção se pautam em um conhecimento estagnado, amarrado. Nas “Ideias de canário” de Machado de Assis, o pássaro amplia seu conhecimento conforme ele vai conhecendo novos contextos e tendo novas vivências. Por isso, quando falamos de leitura e escrita, vamos ampliando nosso conhecimento na busca desse entendimento.
Existem várias formas de leitura, oral, escrita, dialogada etc.  Todas elas são possíveis de se fazer uma boa produção textual. Avaliar o nível de leitura de alguém é bastante complexo, por isso trataremos dos procedimentos cognitivos e sociológicos da linguagem.

O LEITOR, O TEXTO E UMA LÍNGUA INGESSADA

São muitos teóricos que estudam a linguagem e muitos profissionais que se agarram em formulas para explicar o certo e o errado, nesse caminho um tanto íngreme, eles gritam que existe uma língua padrão. Qual seria esse padrão? A língua é uma manifestação da existência do homem e o meio onde ele está inserido. Ele pode dominar algumas técnicas, mas isso jamais o tornará um bom escritor ou leitor.
De acordo com Bagno, há um círculo vicioso que se perpetua em nossa sociedade, levando à concepção de erro linguístico e a promoção de uma variedade da língua como modelo padrão, forma prestigiada é cultivada e se constitui privilégio de poucos, os cultos.
A gramatica determina e inspira a prática de ensino. Surgem a partir disso, os livros didáticos que, por sua vez, recorrem à gramatica como fonte de consulta e concepções sobre a língua. Na atualidade, estamos sob parâmetros mais democráticos de ensino do português, como atestam os PCN. Infelizmente, ainda figuram na escola e nos livros didáticos e manuais a velha concepção fundamentada num ideal ilusório e anticientífico de que há uma forma superior, correta e mais válida do que outras. Este é um grave problema que se pode enxergar nas universidades, pois muitos acadêmicos começam a acreditar que a escrita cientifica eleva seu conhecimento, mas na realidade é apenas uma ferramenta para uso contextual.
O que enxergamos de modo comum é a compreensão do português como apenas uma variedade linguística, a padrão, e a desconsideração às tantas outras variantes. A esse respeito, Marcos Bagno comenta:

Todo esse formidável poder de influência dos meios de comunicação poderia ser de grande utilidade se fosse usado precisamente na direção oposta: Na destruição dos velhos mitos, na elevação da autoestima linguístico dos brasileiros, na divulgação do que é realmente fascinante no estudo da língua. (BAGNO, 2004, p.77)
  
É lamentável ver o cidadão desenvolvendo a sensação de que nunca conseguirá dominar seu próprio idioma. Essa capacidade de uso “adequado” fica restrita a um grupo privilegiado, e a segregação dentro do espaço da leitura e da escrita se alargam.
É mister uma verdadeira mudança de atitude na escola, começando principalmente pelo professor, que poderia transformar o ensino da língua, tornando-o mais efetivo, reflexivo e democrático. É certo que se terá que dominar a semântica e tantas outras ferramentas da linguagem escrita, mas para isso, é preciso inserir o indivíduo no processo por meios humanizados, questionando e refletindo. E não os mecanizando por meio de formas prontas e arcaicas dos livros, gramaticas e manuais. Marcuschi diz que as formas se adequam aos nossos usos.

Uma vez adotada a posição de que lidamos com práticas de letramento e oralidade, será fundamental considerar que as línguas se fundam em usos e não o contrário. Assim não serão primeiramente as regras da língua nem a morfologia os merecedores da nossa atenção, mas os usos da língua, pois o que determina toda a variação linguística em todas as suas manifestações são os usos que fazemos dela. (MARCUSCHI, 2001, p.16)

É preciso se conscientizar dos espaços onde estão inseridos, para assim se apropriar das variações da linguagem e contextualiza-la. Muitos pensam demais em técnicas e esquecem que a leitura e a escrita nos tomam por encantamento. Não dispensamos os usos das técnicas da escrita, pois elas são necessárias para trazer clareza, coesão. Esse processo deve se dar por todo conhecimento construído pelo próprio individuo nas suas vivências e não numa exigência que supostamente estratifica a sociedade pelo domínio de algo que muitas vezes fala, mas não comunica.

A leitura de mundo revela, evidentemente, a inteligência do mundo que vem cultural e socialmente se constituindo. Revela também o trabalho individual de cada sujeito no próprio processo de assimilação da inteligência do mundo (FREIRE, 1996, p. 139).


O DIALOGISMO É A BASE PARA UM LEITOR ÁVIDO E UM ESCRITOR HUMANO

A concepção de que a linguagem é dialógica, foram estudos desenvolvidos pelos sucessores de Karl Max. A linguagem se caracteriza pelas relações intersubjetivas existentes entre os locutores que a colocam em prática.
O Dialogismo nos auxilia nas reflexões acerca da diversidade e heterogeneidade discursivas, orientando, inclusive, na compreensão da noção de sujeito. Isto vem revelar as variadas maneiras de pensar e ver o mundo, o que poderá também trazer à tona distintas formações discursivas e ideológicas, a voz presente nos discursos estará influenciada por valores culturais, comportamentos sociais e referenciais históricos diferenciados e variados.

À luz dessas considerações sobre o grande número de habilidades e conhecimento que constituem a escrita e a leitura, a natureza heterogênea dessas habilidades e conhecimentos, o amplo leque de gêneros de escrita e de portadores de textos escritos a que essas habilidades devem ser aplicadas, claro está que o conceito de letramento de alfabetização é extremamente impreciso, mesmo se tentarmos formulá-lo considerando apenas as habilidades e os conhecimentos individuais de leitura e escrita. (SOARES, 2005, p. 32)

A heterogeneidade mostrada será identificada e observada pelas marcas textuais que se manifestam explicitamente ou implicitamente. Muitos linguistas, filósofos da linguagem e analistas do discurso inseriram em seus estudos pressupostos e conceituações sobre o fenômeno da heterogeneidade, dentre eles:

A heterogeneidade é um traço de constitutividade do discurso, da sua organização. A diferença entre as duas modalidades de heterogeneidade diz respeito ao modo de expressar no discurso: Heterogeneidade mostrada é a que se deixa perceber, é a que, muitas vezes, é deliberadamente exposta pelo locutor, por razões diversas e considerando sempre o seu interlocutor. Já a heterogeneidade constitutiva não se deixa apreender tão facilmente. (BLANCO, 2003, p.38)

A heterogeneidade constitutiva revela-se como algo mais subjetivo e está relacionada ao que Mikhail Bakhtin ressalta ao dizer que é no enunciado e não na oração, considerada aqui como uma unidade da língua e não da comunicação, que o indivíduo apreende a língua, interpreta o significado, atribui sentido ao que ouve, incorporando-o e, mais tarde, emprestando-lhe sua expressividade, ao estar em posição de sujeito falante, enunciador, numa situação dialógica de fala. Isso sim faz sentido para o aluno, independente de qual nível ele esteja.
Uma formação ideológica deve ser entendida como visão de mundo de uma determinada classe social. Ela dever ser vista como um conjunto de representações, de ideias reveladoras da compreensão que uma determinada classe social tem do mundo na qual ela está inserida, sendo estas ideias sempre materializadas, em primeira instância pela linguagem. A este respeito considera:

Como não existem ideias fora dos quadros da linguagem, entendida no seu sentido amplo de instrumento de comunicação verbal ou não verbal, essa visão de mundo não existe desvinculada da linguagem. Por isso, a cada formação ideológica corresponde a uma formação discursiva, que é o conjunto de temas e de figuras que materializa uma dada visão de mundo. (Fiorin,1997, p.32)

As formações ideológicas diversas serão definidoras das formações discursivas que, por sua vez, também se manifestarão caracteristicamente diversificadas. Desse modo, as palavras, expressões, proposições, etc. mudam de sentido segundo as posições sustentadas por aqueles que as empregam. Elas adquirem seus sentidos em referência a essas posições.

(...) o sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma proposição, etc., não existe “em si mesmo” (isto é, em sua relação transparente com a literalidade do significado), mas, ao contrário, é determinado pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio histórico no qual as palavras, expressões e proposições são produzidas (isto é, reproduzidas). (Pêcheux, 1988, p.160)

Alguns professores são perseguidos pelo enorme erro que quase sempre parte do princípio que, tendo aprendido a decodificar as palavras e a oralizar o texto com fluência, o aluno estará pronto para utilizar esse instrumento, a fim de aprender os conteúdos das ciências e encontrar informações em qualquer tipo de texto. Enquanto amarrarem a língua, as produções textuais serão meros códigos que só servirão para os pesquisadores daquela determinada área e se tornarão idiomas perdidos no tempo, por não se permitirem vivenciar essa leitura e construírem uma nova maneira de escrita. É preciso ter consciência que alguém criou os formatos que seguimos, desta mesma forma, podemos criar novos formatos e ressignificá-los, porém, estamos mergulhados numa verdade absoluta que não existe.

Pode-se entender melhor porque ensinar língua materna é uma tarefa que apavora o recém-licenciado em Letras. O novo professor se vê obrigado a lidar com conteúdos muitíssimos diferentes daqueles com os quais lidou na graduação. Vê-se impingido a ensinar análise sintática, corrigir erros de regência, concordância, acentuação e pontuação em redações e restrito aos limites de um livro didático já previamente escolhido pela respectiva escola. Não sobra espaço para a leitura crítica, para leitura dramática de textos, para a discussão de temas de interesse mais direto, que levariam o aluno a um melhor desempenho linguístico. (RAMOS, 1997, p.4)

Em outras palavras, Ramos (1997) argumenta que os problemas linguísticos decorrentes de estilo necessitarão de prática oral e prática escrita para serem minimizados, o que inclui a audição, discussão, repetição, transcrição e “tradução” de textos do estilo cuidado, assim como a leitura de textos de diferentes estilos. Segunda a autora, é importante ressaltar que:

Na classe das diferenças de estilo estão incluídas tanto formas que aparecem na fala das pessoas cultas, quer em situação de monitoração quer em situação espontânea, como também formas que não aparecem na fala das pessoas cultas, tais como: “nóis foi”, vá drumi” etc. Por serem estigmatizadas, estas últimas devem ser tratadas na escola com naturalidade e “traduzidas” por formas de dialetos padrão. E é exatamente por seu peso social que seria importante o professor estar atento a elas, de modo a evitar que sua atitude de rejeição se manifeste. (RAMOS, 1997 p.11)


             É preciso criar o ambiente propício para que este processo de leitura e escrita sejam os mais naturais possíveis. Evitando a obrigatoriedade, porém, mostrando-lhe o seu uso dentro daquele contexto para que esse processo de aquisição se dê de forma mais natural.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse artigo tratou da leitura e da escrita de uma maneira bastante incisiva quanto à linguagem como premissa para tudo que nele se propôs. Os autores citados trazem obras completas e muito significantes. Fica claro neste trabalho que, toda e qualquer construção, quanto à sua leitura e escrita, elas deverão passar pelo crivo da vivência e ambiência. Elas darão as diretrizes ao indivíduo e assim o êxito será certo, pois ele se verá numa nova etapa e galgará tudo no seu devido tempo.
Ler e produzir textos são naturais, mas quando eles chegam como obrigações, as ferramentas mecanizam tudo e algumas coisas deixam de ter sentido. Podemos ler um livro antigo, mas sabemos que não foi o fazer perfeito do escritor, mas seus pulsos e suas verdades dentro de um outro contexto de tempo e espaço, mesmo podendo ainda encontrar leituras e escritos antigos com uma linguagem muito próxima da nossa.

REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. Preconceito Linguístico. 31ª ed. São Paulo: Loyola 2004.
BAKTHIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. Tradução: Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 4 ed. São Paulo: Hucitec, 1988.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra S/A, 1997.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001.
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua Portuguesa (1997). Brasília. MEC/SEF.
RAMOS, Jânia M. O espaço da oralidade na sala de aula. São Paulo: Martins fontes, 1997.
SOARES, Magda. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2005.






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